SE CLAUDE NÃO FOI AOS JOGOS OLÍMPICOS…

Claude acordou excepcionalmente agitado. Apareceu na sala de almoço manquitolando, com sua inseparável bengala, mas demonstrando agilidade e bom-humor incomuns naquela casa pacata e sossegada na bela capital da Normandia. Héloïse já tinha providenciado a arrumação das malas e separado os documentos para a viagem. Era sempre ela quem organizava tudo, inclusive as reservas de hotel. O casal decidira fazer a extravagância de ficar em um hotelzinho no Boulevard Saint-Michel, bem no centro de Paris, para aproveitar a ocasião dos Jogos Olímpicos de 2024.
Para Héloïse era um avanço considerável na recuperação moral do marido, extremamente frustrado desde o trágico acidente que lhe impediu de ir a Los Angeles em 1984. A queda durante o treinamento nas barras paralelas tirara de Claude quaisquer esperanças de seguir na carreira, tão promissora, de atleta olímpico. Foi campeão regional na adolescência e já estava cotado para representar a França na equipe de atletismo nos Jogos de Los Angeles. O acidente tirara dele a realização do grande sonho. Mas o destino provou a sua ironia ao trazer os Jogos Olímpicos de 2024 para Paris, ali tão perto, tentadoramente próxima. Claude não pudera ir aos Jogos Olímpicos na juventude. Pois na velhice, os Jogos Olímpicos vieram até ele.
Malas prontas, documentos conferidos, Héloïse percebe as lágrimas nos olhos do marido. Eles se abraçam e ela diz, em tom conciliador e generoso, que ele merece viver os Jogos Olímpicos pessoalmente e tirá-los da dolorosa memória dos anos idos. Claude enxugou as lágrimas, sorriu para a esposa e colocou sua boina de feltro.
Na frente da casa, junto ao seu Renault 25, modelo clássico, ano 1984, ele suspirou. A mulher colocou as bagagens no porta-malas e assumiu o volante, como costumava fazer. O carro avançou pela estradinha e logo eles iriam pegar a A-13.
Claude recostou-se no banco do carro comprado como presente a si mesmo pela classificação no pré-olímpico para Los Angeles. Héloïse ligou o rádio e uma canção bastante familiar ao casal tomou conta de seus pensamentos. Claude bateu a bengala, divertido, no painel do seu velho Renault, no ritmo da música. A mulher suspirou aliviada. Depois de 40 anos, Claude teria o seu momento Olímpico.

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