Marta, Rebeca e outras guerreiras

     Nunca fui particularmente afeiçoado a qualquer modalidade de esporte quando criança. Talvez a natação, vigorosamente praticada por Johnny Weissmuller nos filmes de Tarzan. Ou a esgrima, por causa do seriado do “Zorro”, com Guy Williams. Ou ainda o arco-e-flecha, por causa de Guilherme Tell e sua balestra, num velho seriado inglês. No entanto, essa jornada olímpica no Japão já nos pegou sentados no sofá, atentos à contagem dos mortos pela Covid-19.

     Enquanto os jogos não tinham início, a TV nos entretinha com relances dos personagens, retalhos biográficos dos atletas que iriam representar as nossas cores, salve, salve. Adorei, por exemplo, ver a sueca Pia Sundhage, treinadora da nossa seleção feminina de futebol, cantando em português um sucesso de Alceu Valença (na brisa leve das canções que vem de dentro), com o auxílio luxuoso de nossa craque Marta ao cavaquinho. Em outra reportagem, La Sundhage cantava essa mesma canção, acompanhando-se ao piano. Fiquei orgulhoso do nosso soft power, e conferi no ato uma medalha de ouro ao valeroso Alceu Valença.

     Também gostei de saber que o surfista Ítalo Ferreira nasceu numa aprazível cidadezinha litorânea do RN, de nome poético, Baía Formosa, e que começou a surfar ainda meninote, em cima de uma placa de isopor. Não se trata aqui de “romantizar a pobreza”, como resmungam alguns, mas de ressaltar o fato de que o atleta encarou todas as adversidades para cavalgar a crista da onda. Dou o maior valor a essa obstinação, e acredito que isso tem muita diferença do caso de outro menino, futuro corredor de Fórmula 1, que era levado a Interlagos, para correr de kart, pelo motorista da família. Mas passemos.

     Sim, eu confiei que a nossa seleção feminina de futebol daria um olé em todas as suas adversárias, e que retornaria ao Brasil coberta de glória, resgatando enfim o nosso brio nacional após a humilhação daquele 7 x 1 sofrido em 2014. Porém, quiseram os deuses do futebol frustrar nossa esperança, impondo-nos aquela derrota melancólica –por pênaltis! –, diante da seleção do Canadá. É de congelar o coração.    

     Fiquei mocorongo, imaginando meus amigos poetas e músicos brasileiros, emigrados para o Canadá, aturando a zoação bilíngue dos torcedores canadenses… Quelle tristesse, mon Dieu… So sad!

     Ah, mas tivemos nosso momento de absoluto triunfo com a encantadora Rebeca Andrade, nossa estrela da ginástica rítmica, que deu um bailão em Tóquio. E a garota ainda se mostra altamente articulada, consciente de que descende de uma linhagem de brasileiras guerreiras. No mínimo, espero que as próximas gerações de meninas recém-nascidas sejam chamadas “Rebeca”, depois de longa supremacia de Jéssicas e Jennifers. Já seria um ganho, não acham?

     No mais, continuo torcendo muito pela carreira do boxeador baiano Abner Teixeira, até por causa de meu tio Cláris, que também foi boxeador e baiano. A luta continua. Que os deuses olímpicos reconheçam o valor dessa gente bronzeada.  

[03.08.2021]

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