Um grand delírio à francesa – Da abertura dos Jogos Olímpicos de Paris 2024

Ah, mes amis, que espetáculo! Que delírio! Que sublime loucura francesa!

A abertura dos Jogos Olímpicos de Paris foi diferente, foi ousada, foi um autêntico vaudeville que só mesmo os franceses poderiam conceber.

Bem-vindos a Paris, mes amis!, onde 85 barcos transportaram mais de 6 mil empolgados e saltitantes atletas através do rio Sena renascido para este espetáculo jovem e tônico em suas águas. Ah, o Sena, rio de tantos amores.

Dizem os mal-amados, estes eternos invejosos da felicidade alheia, que estava xoxo, principalmente para quem estava lá, in loco, debaixo de chuva. Creio que sim, mas ora, 300 mil pessoas nas ruas de Paris – além daquelas debruçadas nas tradicionais janelas e sacadas da cidade luz – é, por certo, uma celebração do povo, para o povo, bem diferente das 50 mil pessoas que conseguem abiscoitar um ingresso – e pagando uma fortuna – quando a abertura dos Jogos se dá dentro de um estádio, ainda que olímpico.

Paris, senhoras e senhores, apresentou um grande teatro de variedade, “voix de ville”, a céu aberto, dia e noite, culturalmente dividida entre Victor Hugo e Toulouse-Lautrec, entre a arte sublime da Mona Lisa e o can-can vulgar.

Margens e pontes. O Sena, ao longo de 6 quilômetros, ganhou arquibancadas cheias de voyeurs, eu sei, cada um conseguindo ver só um pouquinho, tão esparsado, ninguém vê tudo.

Alguns conseguiram ver a Lady Gaga surgindo de trás de uma fila de leques com penas cor-de-rosa, essa Madame de Pompadour dos tempos modernos, vestida para um cabaré de primeira categoria, outros tiveram a sorte de ver o mascarado – personagem que alinhava toda a narrativa – correndo nos telhados com a tocha olímpica.

Não é algo para se esquecer tão cedo.

A banda francesa de heavy metal Gojira e a representação de Maria Antonieta, decapitada.

Alguns puderam apreciar a “La Marseillaise” cantada pela mezzo-soprano Axelle Saint-Cirel, em pé, ao lado da bandeira da França, no telhado do Grand Palais. Outros puderam ver 10 estátuas de figuras históricas emergirem das águas do rio, uma a uma, bem ali, aos olhos da Assembleia Nacional (pra bom entendedor…): Olympe de Gouges em defesa aos direitos das mulheres, Alice Milliat com sua batalha pela inclusão de mais eventos esportivos femininos nos Jogos Olímpicos, a advogada Gisèle Halimi, Simone de Beauvoir com a igualdade de gênero, Paulette Nardal pela igualdade racial, a exploradora Jeanne Barret, a heroína Louise Michel, Christine de Pisan e sua literatura medieval, a cineasta Alice Guy e a ativista francesa Simone Veill, primeira mulher a assumir a presidência do Parlamento Europeu.

E, diante tantas lutas, o que dizer da ousadia francesa em recriar Dionísio, em um banquete com drag queens? Ah, mes amis, só mesmo os franceses para trazer esta mensagem clara de que estes Jogos são para todos, sem exceção.

Ápice.

Saindo da radiante Torre Eiffel e de volta ao Sena, a chama olímpica é carregada por semi-deuses: Rafael Nadal, Serena Williams, Carl Lewis e Nadia Comaneci. No Louvre ela continuou sua viagem ao Jardin des Tuileries na companhia de 18 lendas olímpicas e paralímpicas da França até chegar nas mãos de Teddy Riner e Marie-José Pérec na caminhada até a pira – um anel de chamas preso em um balão de ar quente, um verdadeiro testemunho do espírito francês.

Grand finale.

Enquanto o fogo olímpico subia aos céus, as primeiras notas da canção “L’hymne à l’amour”, de Edith Piaf, soaram e Celine Dion, qual fênix renascida, emergiu na Torre Eiffel para saudar Paris e os Jogos.

E assim, senhoras e senhores, Paris deu o pontapé inicial nesses Jogos Olímpicos.

Paris, a capital do amor – e do esporte.

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