Deja vu

Voltemos ao início dos anos setenta (sim, alguns de nós, dinossauros, ainda estamos por aqui!). O Brasil era mais um “primo pobre” no cenário global dos esportes. Algumas boas vitórias no futebol, no basquete, alguns destaques individuais meritórios que a pátina do tempo faz questão de esconder, e só. Havíamos tido alguns medalhistas olímpicos, mais por méritos próprios e individuais, do que, propriamente, por força coletiva de nossa gente.
Produzimos um Eder Jofre, uma (maravilhosa) Maria Ester Bueno, um Abilio Couto (para quem não conhece, seis vezes campeão mundial de natação em longa distância e que atravessou a nado o Canal da Mancha sendo, por isso, condecorado pela Rainha Elisabeth). Andorinhas solitárias que faziam questão de tomar rumos opostos à grande maioria de nossos esforçados atletas que, tentavam e tentavam, em vão, obter algum sucesso significativo. Claro que havia exceções. Um grande Manuel dos Santos, do nosso interior paulista, à altura, recordista mundial dos cem metros nado livre, nos jogos de Roma, 1960, perdeu a medalha de ouro na final pois não sabia fazer a virada por baixo da água! É, a técnica não havia chegado por aqui e o recordista mundial teve que contentar-se com o bronze. Ainda assim, um gigante!
Voltemos a 1972, jogos de Munique, de triste e controversa memória, devido aos ataques dos terroristas palestinos á delegação de Israel. Uma tragédia s em precedentes. Pois bem, voltamos com duas opacas medalhas de bronze. Se não me falha a memória, aquele menino de meros 12 anos de idade torceu como um louco e frustrou-se como tal. Todas as manhãs aguardava ansioso a entrega do exemplar do jornal A Folha de São Paulo, para conferir o quadro de medalhas. Esse, ia engordando para os EUA, a então União Soviética, a Alemanha Oriental, Itália, Cuba, tantos outros países. E nós, nadinha.
Quatro anos depois e a mesma realidade se impôs: mais duas medalhinhas de bronze, se não estou enganado. Jogos de Montreal, aquele da linda e talentosíssima Nádia Comaneci. Preguiça de consultar a Wikipedia! (Olhei, confere!). Éramos meros coadjuvantes dos coadjuvantes no cenário esportivo mundial. Com uma população enorme, recursos imensos, nossos dirigentes, sempre eles, não davam a devida atenção aos esportes de base. Óbvio que apareciam nas fotos cumprimentando os desavisados vencedores que, de tempos em tempos, teimavam em contrariar os prognósticos.
Veio Moscou, 1980, boicote americano e evoluímos um pouco. Os esportes coletivos, tipo vôlei começaram a dar alguma esperança, ainda que na altura, tênue. Duas medalhas de ouro e o 17º lugar no placar geral eram mais do que decentes. Fomos evoluindo, Los Angeles com o impagável Joaquim Cruz nos trazendo a única dourada e provando que era um gigante, depois Seul, Barcelona, Atlanta, tropeço em Sidney de onde voltamos zerados de ouro e, numa distante 52ª posição no quadro de medalhas.
Novo século, novos investimentos, as coisas melhoraram sensivelmente: 5 douradas em Atenas, 3 em Pequim e Londres, 7 em casa, no Rio de Janeiro no vergonhoso espetáculo de corrupção e incompetência tupiniquins, 7 em Tóquio e o 12º lugar no ranking. Havia motivos para otimismo em Paris. Até agora, quinta feira da primeira semana, em vão. Não passamos de uma medalha de prata e 3 de bronze. E muitas frustrações. Até a Marta, a Marta!, foi expulsa do jogo contra a Espanha hoje, onde por sorte, as americanas, ao derrotarem a Austrália, nos ajudaram a obter classificação. Nomes que eram tidos como sérios candidatos a medalhas, voltaram de mãos vazias. Atletas foram expulsos do alojamento. O futebol masculino nem ao menos se classificou para ir aos jogos. O basquete masculino, classificou-se no último instante, mas não está justificando entusiasmo algum da torcida.
A maravilhosa Rebeca Andrade e suas obstinadas companheiras de time estão fazendo bonito e o terceiro lugar na competição por equipes na ginastica artística foi de longe o nosso melhor resultado histórico. Ainda pode vir mais alegrias dali. O judô, fonte certa de medalhas, decepcionou, assim como a natação. Portanto, ao homem de mais de seis décadas que já esteve na pele e na alma daquele garoto de 12 anos de 1972, a sensação de deja vu é inevitável. A tristeza de saber que estamos condenados para sempre, em moto perpétuo a sermos o “país do futuro” é um peso atroz.
Resta alguma esperança, mas o brilho, a centelha dos primeiros dias já era. Já caímos em baque surdo no chão duro da realidade. Espero que a sensação de frustração tão familiar se afaste e tenhamos algumas boas surpresas ao longo dos próximos dias. Muitos atletas se preparam com muito sacrifício e têm talento muito maior do que o demonstrado até aqui. Que as peças do xadrez se encaixem e nos façam justiça. Nosso lugar é, no mínimo, entre os dez maiores do esporte! Aceitar algo menos que isso é conformismo manso e celebração do complexo de vira latas. Acorda, Brasil!

Compartilhar:

Curta nossa página no Facebook e acompanhe as crônicas mais recentes.