Torcer, torcer, torcer…

Gosto de torcer. Escolho um lado de qualquer competição, incentivo, apoio e espero, é claro, pela vitória. Nem me dou conta e, quando vejo, torço até na corrida de baratas do Museu de Insetos do Instituto Biológico. Nestas Olimpíadas, contrariando meu entusiasmo, fiz a escolha tão difícil quanto preguiçosa de não torcer. Tóquio fica lá longe e a culpa é das doze horas de fuso. Quando acordo, já torceram por mim e fica um gosto de emoção terceirizada que tento contornar com os replays. Não é a mesma coisa, mas ainda assim tenho me comovido a cada medalha e cada derrota brasileira.

Torcer, na verdade, se torce sempre. Depois das difíceis discussões políticas que a gente , faz tempo, vem acompanhando nas redes, foram nestes Jogos, com as opiniões sexistas, preconceituosas e retrógradas (numa espécie de Olimpíada Paralela da Lacração) que voltei a me dar conta do tanto e quanto a gente entra numas disputas todas os dias e sempre escolhe algum lado. Nesta contenda de opiniões, eu torci o nariz para os conservadores olímpicos, dei um ‘duplo twist carpado” e caí de cabeça numas ideias de torcer.

A gente torce o paninho de pia, o pano de chão, as pontas dos cabelos, a calcinha no chuveiro e se dá conta de que ninguém além de você, agora, torce o trinco da porta de entrada. Vai até o próprio berço na infância e volta ao berço dos filhos. Quando o bebê chora, torce pra alguém escutar e depois que os pais atendem, os pais torcem pra ele dormir. E a gente torce o corpo pra jogar vídeo game, torce pra um dia de sol e torce também pra chover.

Viaja e torce pra chegar logo. Torce pra dormir e ,se não dorme, torce pra amanhecer. Sem ter como fugir, pensa nas mortes, nos próximos, na própria morte e nem sabe se torce, mas deve torcer pra este dia, que um dia chega, nunca chegar.

Torce pra ganhar na Megasena, torce para o que se produz ficar pronto, pra ninguém adoecer, alguém sarar, tomar vacina, receber um carinho, o presidente cair, o país nascer de novo, ter comida pra todos, a floresta ressuscitar, a orquídea dar flor, o bolo crescer, o cachorro da vizinha parar de latir, a grama resistir, não ter fila no cinema, voltar a ir ao cinema. Torce pra não passar vergonha com uma lista de torcer.

Parabéns, Rebeca Andrade pelo ouro na Prova de Salto. Parabéns, Bruno Fratus pelo bronze nos 50 m. Ginástica e Natação. Vou procurar os replays e continuar minha torcida à distância e nos sonhos. Se está dando certo, melhor não mexer. Só vou trocar, lavar e torcer os lençóis depois das Olimpíadas.

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