De forma simplória, mas bem calculada, o Japão batizou suas olimpíadas de Jogos da Recuperação. Foi bem antes da pandemia de covid que parou o planeta e periga tirar o brilho da busca obcecada por superar limites físicos na olimpíada. Nem bem se recuperou de uma, o país está no meio desta que todos do planeta vivenciamos. A outra foi o trauma causado pelo desastre nuclear ocorrido na usina de Fukushima em 2011. Passados dez anos, os japoneses garantem que a região está limpa, há garantias de que todos podem chegar sem medo de virar transformer mais do que já é um humano ansioso por superar limites e medalhas de ouro.
Mas fiquei tomado de dúvidas, ainda que não vá passar nem perto de lá. O motivo que me alertou vários sentidos foi a notícia de que a baía de Tóquio foi invadida por mais de dez toneladas de ostras. Elas encontraram residência confortável nos flutuadores destinados a impedir as ondas de ricochetearem sobre os atletas de canoagem e remo que disputarão as medalhas naquele lugar. Com seu peso elas estavam fazendo os flutuadores afundar. Mais de 1 milhão de dólares foram gastos para limpar tudo e evitar acidentes, pois se alguém aqui já tentou achar esse molusco dentro do seu pijama sabe que ele é cortante e não pode ficar lá ameaçando a jugular dos atletas.
Essas férteis ostras são conhecidas como magaki e são muito populares no inverno, mas, por questões sanitárias foram todas descartadas, mesmo sendo valiosas e sabe-se lá se com pérolas, que são como medalhas de ouro quando alguém encontra uma…
Formado na cultura japonesa, com a imaginação tomada por National Kid, Godzilas, monstros cascudos de todo tipo, juntando isso com um desastre nuclear e uma invasão tenebrosa de moluscos que se proliferam por alterações radiativas, a fantasia é digna de um thriller de terror. De noite, madrugada adentro, nós aqui, fustigados pelos mistérios noturnos, enquanto os atletas, lá no Japão, à luz do dia, enfrentam os ataques de moluscos gigantes sem poder pingar um limão nos bichos e fazer eles descerem pela goela com um chopinho gelado. Pior, sem mesmo poder passar a língua nos moluscos, se é que me entendem, com aquele prazer erótico e húmido que somente uma sereia da Odisseia traduziria. Madrugada terrível. E que consolo: quem conseguir sobreviver derrotando os moluscões vai ganhar um ouro fosforescente de tão radiativo!
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Ademir Demarchi
Ademir Demarchi nasceu em Maringá-PR em 1960 e reside em Santos-SP, há mais de 30 anos escutando os rojões do caldeirão da Vila Belmiro. Escritor e editor de poesia, manteve coluna de crônicas por oito anos e meio no jornal impresso Diário do Norte do Paraná, que foram reunidas no livro Siri na lata (Realejo, 2015). Para o autor, o cronista é como o tal siri na lata, sempre em estado de atenção, mesmo que lírica, em relação aos acontecimentos. Seus livros mais recentes são: Espantalhos e Contrapoéticas (Editora Nave, 2018 e 2020), de ensaios; e os livros de poemas Cemitério da Filosofia - Preceitos da dúvida (Kotter, 2020) e In Fuck We Trust (Urutau, 2020).
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