De quatro em quatro anos, Mamãe Natureza – com a sua sabedoria e o patrocínio da Nike e da Coca Cola – reúne atletos e atletas em algum recanto aprazível do planeta porque…
É tempo de Olimpíadas! É tempo de congraçamento, quando os povos do mundo todo podem se unir e livremente falar mal uns dos outros! (Menos a Rússia, que parece que a guerra deles é ilegal, ao contrário de todas as outras guerras do planeta.) É quando se realiza a grande festa dos recordes e dos acasalamentos na Vila Olímpica! E eu não poderia deixar de registrar esses momentos de emoção, competição, desvio de verbas e expulsão dos imigrantes pobres que vivem ali pelas margens do Sena. Vamos lá, torcedoros e torcedoras, todo mundo junto! Mas em fila indiana senão vira zona!
É verdade que a maioria de nós não sabe diferenciar um chinês de um singapurano (ou singapurê, não sei também). E pensa que Trinidad e Tobago é uma nova dupla sertaneja. Nem falo da diferença entre as Coreias do Sul e do Norte, porque essa nem eles sabem. Toda olimpíada é a mesma coisa: as equipes dos dois países têm que voltar em aviões, horários e aeroportos diferentes, senão mistura todo mundo e daqui que separe já tá nas vésperas da próxima olimpíada. É verdade também que a classe média brasileira adoraria que essa jogatina toda fosse logo em Los Angeles, ou melhor ainda, em Miami, onde tem cassino, dá pra comprar tênis novo e um monte de bugiganga. Sem falar na quantidade de atletas do terceiro mundo que, no meio da maratona, entra na primeira embaixada que encontra e pede asilo.
Mas as Olimpíadas de Paris estão se revelando uma grande oportunidade para a troca de experiências esportivas. Já foram descobertos dezenas de novos tipos de doping, até então desconhecidos pela ciência e pelo faturamento dos laboratórios. E os países estão podendo colocar em prática infinitas formas de subornos para os mais variados tipos de juízes nas mais diversas modalidades esportivas. Isso sem falar nas torcidas organizadas que, representando a pluralidade da vida humana e principalmente da vida desumana, vêm demonstrando os inúmeros métodos culturais que cada região do planeta possui para espancar seus adversários.
Porém nem tudo são flores. Tirando esse lado bom sobram promessas e mais promessas não cumpridas. As autoridades francesas, por exemplo, não conseguiram despoluir nem os banheiros da Torre Eiffel, quanto mais as águas do rio Sena, conhecidas em Paris como “L’eau que passarinhô ne bebê pas”.
Houve também protestos também na área esportiva. A turma do Futebol de Salão não aceitou ficar mais uma vez de fora das Olimpíadas e resolveu fazer uma disputa paralela, no salão de entrada do Louvre. Mas a final entre as Ilhas Tuvalu e o Vaticano, marcada para hoje de manhã, não aconteceu porque o salão estava trancado e o porteiro que guarda as chaves não veio trabalhar. As equipes ainda tentaram jogar no corredor, mas os síndicos do Louvre e da Vila Olímpica chamaram a polícia e foi todo mundo parar na delegacia, onde também é proibido jogar.
Mesmo assim, atento à evolução tecnológica dos esportes, o Comitê Olímpico Internacional já autorizou a inclusão da Corrida Armamentista, o esporte mais popular do planeta, nas próximas Olimpíadas, com distribuição de medalhas de urânio enriquecido. Também incluiu mais um novo esporte, o box-pong, onde se pode dar raquetada na cara do adversário. Já nas Olimpíadas de 2028 há promessas de muitos avanços na área do tiro ao alvo. O atirador vai conseguir dar um tiro lá de Los Angeles, acertar a orelha do Trump e pelo menos uns dez palestinos em Gaza.
Por fim, antes das festas de encerramento, vamos aos últimos resultados de hoje: no basquete, o time da PM paulista encestou mais um adversário.
E por hoje chega, que quem vive de medalha é santo.
(Cesar Cardoso é escritor medalha de ouro em arremesso de reticências e nos 300 metros com cedilha.)