Aproxima-se o início dos Jogos Olímpicos de Paris. Sou um fã confesso dos esportes, olímpicos ou não. Acompanhei vorazmente, à distância, todas as edições dos jogos, de 1972 até agora. Confesso, no entanto, que, pela primeira vez na vida, não me sinto entusiasmado com a presente edição. Talvez com o início das competições eu me envolva de forma mais, digamos, intensa.
Posso tentar especular as razoes pelas quais meu interesse tenha se dissipado, talvez a idade, talvez a perda da inocência (proverbial isso), talvez, quiçá…. especulações não nos levam a lugar algum. A verdade é que, estamos todos fartos. Há uma sensação de desencanto, de cinismo patente no ar. Já não acreditamos em duendes e a palavra da moda é “narrativa”. O mundo pós pandemia nos trouxe outras prioridades e a comprovação de escândalos recentes de doping nos esportes de alto nível, tampouco ajudam a mitigar o fato de que já não somos os mesmos.
O amadurecimento (palavra mais suave e benigna que envelhecimento) me trouxe muitos benefícios. E talvez, (tantos talvez …. sinal de início de senilidade? Talvez) um baita cinismo. Sabemos que os países poderosos ou com interesses ideológicos escusos usam os jogos para provar superioridade. Investem milhões na preparação de seus atletas para mostrar ao mundo o quão bons eles são. Não há a necessidade de voltarmos a Hitler e aos jogos de Berlim, 1936 para ilustrar esse fato (viva Jesse Owens). Basta relembrar os anos da Guerra fria e as muitas medalhas da Alemanha Oriental e mesmo de Cuba. O que isso revertia em bem-estar ou qualidade de vida para seus cidadãos? Sem nenhuma liberdade? Portanto, parte de meu cinismo vem do fato de que os jogos são, muitas vezes, manipulações para enviar mensagens que são falsas. Outra parte de mim, no entanto, fica bastante ansiosa para que os jogos comecem e novos nomes surjam para nos encantar. Lembro-me ainda hoje da primeira vez que ouvi o nome da romena de 14 anos de idade, Nádia Comaneci. A primeira a obter as notas dez em provas de ginástica. Sete! Nas olimpíadas de Montreal em 1976. E eu, trabalhando nas férias e perdendo muito dos jogos!
Hoje, quem diria, temos o privilégio de torcermos por uma compatriota, a maravilhosa Rebeca Andrade. E já tivemos a querida Daiane dos Santos. E tivemos Joaquim Cruz no atletismo, os moços do vôlei de quadra, as meninas, tanta gente. Mudou muito! Não tenho certeza de nossas possibilidades de medalhas na atual edição dos jogos, mas são muito maiores que aquelas das décadas de 60, 70 e 80 do século passado.
Nossos ministérios são de uma crônica ineficiência. As federações idem. O brasileiro se acostumou a esperar e a obter pouco. Teremos com certeza medalhas na vela, na ginastica, quem sabe algum brilhareco individual no judô ou no atletismo. Mas, continuaremos a viver nossa eterna síndrome do “complexo de vira latas”. E, mesmo que sejamos milagrosamente resgatados da derrota, a síndrome vai se renovar a cada quatro anos.
Voltemos a Paris. Políticos são os mesmos em qualquer lugar. A prefeita e a ministra dos esportes mergulharam no rio Sena. Para provar que ele foi despoluído para as competições de triatlo e maratona aquática. Deus proteja os intrépidos nadadores!
Enfim. Uma cidade, outrora luz, hoje muito decadente num país e num continente idem. Jogos que já foram mais bem divulgados em edições anteriores. Mas em uma coisa, senhores, temos a medalha de ouro incontestável: os jogos mais corruptos foram os realizados no Rio de Janeiro em 2016. Medalha de ouro difícil de ser batida!
Au revoir!
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Cezar Fittipaldi
Escritor diletante, ourinhense de nascimento e coração, professor de escola pública, ex-empresário, eterno sobrevivente nesse país de desafios, encara a vida como uma gigantesca obra literária em tempo real. Seu esporte favorito é o automobilismo, gosta de basquete, atletismo, natação e o futebol já foi mais apreciado. Já assistiu a numerosas copas do mundo, todas pela televisão, e torce comedidamente pelo time do Brasil, sabendo separar ufanismo e nacionalismo de amor ao esporte.
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